Nossa Senhora da Assunção e São José


25 - VOCÊ VIU A DEUS?

Livro da Vida 9,5

“Com sua espiritualidade criativa, Teresa consegue olhar um pouco além daquilo que vê.
Olha para os campos, para as flores, para a água e em tudo isso vai descobrindo e vendo sinais do próprio Deus”.

5. Voltando ao que dizia do tormento que me davam os pensamentos, este modo de proceder sem discurso do entendimento tem isto: a alma há-de estar ou com muito ganho ou perdida: digo perdida por não poder considerar. Em aproveitando, aproveita muito, porque é em amar. Mas, para chegar aqui, é muito à sua custa, salvo as pessoas a quem o Senhor quer muito em breve fazer chegar à oração de quietude, e conheço algumas. Para as que vão por este caminho é bom ter um livro para depressa se recolherem. Aproveitava-me também a mim, ver o campo, água ou flores. Nestas coisas encontrava eu memória do Criador; digo que me despertavam e recolhiam e serviam de livro, tal como pensar na minha ingratidão e pecados. Em coisas do Céu e em coisas sublimes, era meu entendimento tão grosseiro, que nunca jamais as pude imaginar até que - por outro modo - o Senhor mas representou.

 


Assim pés na estrada... sob a guia do hábil pincel do Frei Ivo.

 

O texto de Teresa, colocado ali em cima, é mais uma vez, umas destas obras primas de nossa Santa, pela sua tremenda atualidade.

Quem de nós não encontra hoje, no seu relacionamento com Deus, dificuldades para se concentrar. Dificuldades para deixar-se envolver pela presença de Deus. Dificuldades para descobrir e sentir que Deus está ali e que deve ser o “objeto” de todo o meu ser. Dificuldade para perder-se em Deus. Dificuldade para deixar-se amar por Deus.


                                        

Teresa descreve de um modo tão real este tipo de dificuldades, que até parece que ela está vivendo neste nosso tempo. Um tempo de tanta agitação, de tanta correria, de tanta competição, de tanto barulho. Um tempo de tantas preocupações, de tantas angústias e de tantos sofrimentos.

E ela, com sua incrível criatividade, começa a nos mostrar como é possível de se ver a Deus e de se sentir a Deus através de tantas coisas e tantos modos diferentes. Com sua espiritualidade criativa, Teresa consegue olhar um pouco além daquilo que vê. Olha para os campos, para as flores, para a água e em tudo isso vai descobrindo e vendo sinais do próprio Deus.


                                        

Quem ama de verdade, consegue ver o Amado, naquilo que seus olhos olham. Ou melhor, quem consegue ver o Amado naquilo que está olhando, de verdade, já não está mais apenas olhando, e sim, está contemplando.

Quando uma pessoa, porque ama, é capaz de ver um pouco além daquilo que está enxergando, é certo de que esta pessoa está fazendo esta linda experiência de saber que “o essencial é invisível aos nossos olhos e de que só se vê bem com o coração,” como tão bem nos dizia o Pequeno Príncipe.

Olhos que olham com amor, não ficam parados no que vêem.

Olhos que olham com amor, não ficam estacionados na materialidade do que enxergam.

Olhos que olham com amor, são como um “raio x” que consegue ver por dentro e ver por dentro, é ver com o coração.

Olhos que olham com amor, são olhos que viram “olhos de poeta” e que conseguem ver verdadeiras maravilhas, onde outros não vêem nada mais do que o normal e natural.


                                                   

Veja esta belíssima narração do nosso grande pensador Rubem Alves, que assim escreve:

“Ela entrou, deitou-se no divã e disse: "Acho que estou ficando louca". Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. "Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões. É uma alegria! Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica. De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões... Agora, tudo o que vejo me causa espanto."

Ela se calou, esperando o meu diagnóstico.

Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as "Odes Elementales", de Pablo Neruda. Procurei a "Ode à Cebola" e lhe disse: "Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: 'Rosa de água com escamas de cristal'.

Não, você não está louca.

Você ganhou olhos de poeta... Os poetas ensinam a ver".

Para ver a Deus.... Para fazer experiência de Deus... Para contemplar a Deus... é preciso ter olhos e coração de poeta. Quem tem olhos e coração de poeta, olha para a mesma coisa que os outros e vê o que os outros não vêem.

Pegue o pincel e tente retratar na tela de sua vida este tipo de olhar: um olhar que é capaz de ver aquilo que não aparece naquilo que você vê. Fazendo isso, aí sim, você vai acabar vendo a Deus.

Frei Ivo Bortoluz OCD

 


                                                                    Vamos rezar com as Irmãs...
 

                                                                         

Ó Santa Teresa de Jesus
caminhai conosco,
para daí seguirmos contigo...

Concede-nos Senhor que buscando o Teu olhar possamos vê-Lo em tudo e em todos. E ao mesmo tempo ser um reflexo do Teu olhar para todos os que de nós se aproximarem .

Amém.